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Associação para a Defesa do Vale do Bestança
   


Descida do Bestança 2007

Descida do Bestança 2006

Dias: 14 e 15 de Julho de 2007

A descida do Bestança é a iniciativa por todos mais aguardada em cada ano que passa. A ADVB aproveita o ensejo para junto dos muitos participantes divulgar acções desenvolvidas e a desenvolver, recomendar sítios com interesse histórico, arqueológico, etnográfico e religioso no Vale do Bestança e proceder a actividades de sensibilização ambiental.


Ver as fotografias de 2007.

Pela manhã soalheira do dia 14 de Julho de 2007, juntaram-se em Valverde cerca de 70 caminheiros para encetarem mais uma descida do Bestança.
Cumpridos os procedimentos de logística no transporte de tendas para o Prado, em tractor ( e aqui agradecemos o apoio do Sr. Franklim Resende, e o trabalho empenhado dos srs. António José e Anselmo ), e depois de ouvido o briefing matinal, começou-se a caminhada, que passou por Vila de Muros, onde se admirou a escola primária (agora sede da ADVB), em direcção a Enxidrô. O cruzeiro de Santa Madalena, obra de restauro efectuada pela ADVB, indicava-nos a descida para o rumorejante Bestança. Fizemo-la por um caminho estreito e muito declivoso, tendo de se vencer degraus toscos e cobertos de vegetação para chegarmos a um palheiro em ruína no topo de uma rampa abrupta que tivemos de descer com muito cuidado, agarrados a ramos de loureiro e freixo. Avistámos as águas frescas e límpidas do rio nas fragas de Ganão, após passagem pelos arruinados moinhos de Pelisqueira.
Aqui, o grupo descansou e muitos tomaram um banho refrescante a que se seguiu uma ligeira refeição. A subida das fragas revelou-se difícil. A solidariedade de todos permitiu uma progressão sem grandes sobressaltos. Alguns, mais afoitos, subiram a uma árvore e lograram escalar a penedia até alcançarem um outro poço mais a montante. Este é um dos sítios mais bonitos do rio, com cachoeiras sucessivas e quedas de água, com mais de dez metros de altura, imersas numa vegetação de um verde estonteante.
Das fragas de Ganão até à ponte de Covelas, a caminhada revelou-se acessível já que leito é plano, se bem que com pedras polidas muito escorregadias. Uma densa vegetação propende para o rio. São carvalhos, freixos, amieiros e salgueiros que bordejam as margens e que se adensam por sobre o leito do Bestança. Muitos moinhos abandonados e levadas derrubadas, dão-nos o retrato cruel de uma actividade agrícola quase inexistente em contraste com os trabalhos febris doutros tempos. Os açudes, muitos deles destruídos, impedem que a água circule pelos canais para irrigar os campos onde crescem silvas e juncos. Mas a beleza do rio é inigualável. A combinação da água cristalina com o verde majestoso e o enquadramento das obras humanas revelador de uma arquitectura tradicional respeitadora do meio ambiente, dá um produto final de paisagem única que é sempre preciso proteger e reabilitar.
Almoçámos duas centenas de metros a jusante da ponte de Covelas. Enquanto uns participantes aproveitaram o sol, outros saborearam a sombra, dormindo uma invejável “siesta”.
A inexorável hora de partida chegou, determinando o fim do descanso. Partimos com destino ao acampamento. Passámos sob a ponte, admirável na sua cantaria sobrepujada pelo misticismo da cruz sobre a cartela que nos relata o ano de construção e nos indica o mentor da mesma.
No Poço da Dornas, nova paragem para um banho. Este é talvez o poço mais bonito do rio. Extenso, profundo, rodeado de penedia e basta vegetação. A água parece brotar de entre pedras gigantescas, formando sulcos naturais onde alguns aproveitaram para fazer hidromassagem. Neste troço do rio, a solidariedade entre os participantes foi notável, sendo necessário dar a mão ou esticar um ramo para que os menos ágeis vencessem os obstáculos. Notabilizou-se o Luís Gonçalves pela sua generosidade e simpatia.
Por volta das 18H00 chegámos ao Prado. Mas nem todos. O José Sampaio e o Antão, representante da Associação Gardunha Viva, chegaram à 20H00. O Antão revelou muita dificuldade no percurso. Culpabilizou uns abomináveis sapatos, de sola rígida, próprios para a areia da praia mas muito pouco recomendáveis para as pedras roliças e escorregadias do Bestança. Houvesse um prémio “caracol” e ele, mesmo assim, pese embora a paciência e linguagem motivacional do Sampaio, tê-lo-ia perdido.
Montadas as tendas e conseguida a lenha para o braseiro nocturno ( tarefa a cargo do Carlos Manuel Gonçalves e amigos ), eis que chega o anho assado com batata e arroz de forno. Só a amizade e colaboração dos Srs. Adriano Macedo e Gilberto Gonçalves tornam possível este repasto no coração do Bestança. Antes, porém, houve tempo para reunir alguns dos habitantes de Valverde e saborear um belo jantar em casa do Sr. Gilberto Gonçalves, o que parecia uma alargada família, ao bom sabor dos tempos ancestrais.
Carregou-se o tractor com cestos almudeiros onde a refeição foi transportada.
Jantou-se opiparamente no Prado. A noite, de uma suavidade notável, foi animada pela tocata do Rancho Folclórico de Santa Quitéria de Tendais que tocou, entre outros assinaláveis êxitos, o “ Apita o Comboio”. À meia-noite, já que a licença expirava a essa hora e ninguém queria prevaricar, a tocata emudeceu e todos se recolheram ao remanso das suas tendas.
O céu estava, por essa altura, estrelado, mas a noite apresentava-se de densa escuridão já que era lua-nova. No domingo, ainda os melros acordavam num lento pipilar, e já alguns se banhavam nas águas do rio. Mas estava o céu enublado, mal-disposto.
Desfeitas as tendas, só uma trintena de corajosos arranjaram coragem para desafiar o tempo e fizeram o percurso previsto: Prado-Chão-Soutelo-Mártir de São Sebastião-Valverde.
Mas estes afoitos seriam divinalmente torturados ( ou compensados ). Para começar, uma subida até Chã por um carreiro lajeado, a pique, por entre frondosos carvalhos. Admirámos aqui umas bonitas alminhas, com três nichos horizontais, encimados por cruz, cavados na pedra que se ergue sobre um afloramento rochoso natural.
Em Soutelo, parámos na escola primária, agora fechada e entregue a si própria. Está um pouco afastada do povoado, sobre uma plataforma donde se alcança grande parte do vale do Bestança. No recreio, onde outrora brincavam crianças, crescem agora silvas e tojos, sinal funesto de desertificação.
Depois de passarmos o povoado, descemos em direcção à ponte de Soutelo, no Bestança. Íamos a meio do caminho quando vimos uma enorme coluna de denso nevoeiro que, a grande velocidade, subia de jusante para montante envolvendo todo o vale e escurecendo o dia. Parecia uma enorme cortina que fechava o palco depois de um concerto musical. Começou a chover copiosamente. Abrigámo-nos debaixo de um corpulento carvalho que ainda tentou proteger-nos com os seus poderosos braços e farto tronco. Mas não era possível. Alguns ousaram orar e foi quando a chuva se tornou mais intensa e abundante. Fizemo-nos ao caminho e daí até Valverde não mais a chuva parou.
Tirámos uma fotografia para memória futura no adro da capela de São João de Valverde, todos ensopados, transidos de frio.
O dia quente e pejado de sol de sábado não denunciou tamanha tormenta.
O grupo terminou o convívio na sede da Associação, em Vila de Muros, comendo ainda farta merenda que sempre o Gavino Vaz Pedro providencia.
Esta foi, sem dúvida, a caminhada dos quatro elementos: terra, ar, fogo e água, muita água.
Cumpriu-se mais um convívio memorável e mais uma vez se divulgou a beleza Cinfanense e a hospitalidade das suas gentes. Até ao ano, que já temos saudades.

Fotografias