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Cinfães do Douro: Bestança não quer barragem à porta
Associação local de defesa do património contesta a construção
de mini-hídrica e agricultores afirmam que os campos podem secar
MANUEL VITORINO
A anunciada construção de uma barragem no rio Bestança, em Cinfães
do Douro, trouxe à superfície um caudal enorme de protestos e, tanto
a Junta de Freguesia local como a Câmara Municipal, estão contra o
projecto. A contestação já galgou as margens do concelho.
É num vale integrado na Rede Natura 2000 que a Hidroerg-Projectos
Energéticos, Lda., de Lisboa, pretende levar avante a construção de
uma mini-hídrica, cujos açudes de betão, com oito metros de altura,
canais de derivação, condutas de aço, central hidro-eléctrica e turbinas
poderão pôr em causa o ambiente e a biodiversidade.
O empreendimento é tema de conversa. «A barragem vai secar os campos
e causar a morte da agricultura. Por isso, não vamos permitir semelhante
agressão ambiental», referiu Adelino Teles, presidente da Junta de
Freguesia de Tendais.
Alterações ambientais
O advogado Jorge Ventura, presidente da Associação para a Defesa
do Vale de Bestança e investigador do património local, não tem dúvidas
em afirmar que a barragem provocará alterações nos ecossistemas aquáticos
e causará o desaparecimento de algumas espécies protegidas, como a
lontra.
«O Ministério do Ambiente terá de chumbar o projecto. A barragem fica
situada junto a uma ponte medieval e em fase de classificação como
monumento de interesse público. O projecto apenas é lucrativo para
alguns», afirmou.
Num longo e exaustivo dossiê, entregue pela Associação de Defesa do
Vale do Bestança à Direcção Regional do Norte do Ambiente e Ordenamento
do Território, formulam-se dúvidas e interrogações quanto à qualidade
científica dos projectos.
«Os estudos revelam a inexistência de um trabalho de campo aprofundado,
pois não há dados sobre a geologia e geomorfologia, isto é, não há
reconhecimento local dos elementos a considerar, bem como o impacto
da construção na fauna e flora locais», sustentam os contestatários
do projecto.
Atentado ecológico
O juiz-desembargador Fernando de Oliveira Vasconcelos tem a mesma
opinião. «A barragem não vai trazer riqueza à população local e não
será geradora de desenvolvimento. Tal como está concebida, é uma aberração
e representa um atentado ecológico», sustentou.
Em declarações prestadas ao JN, aquele magistrado sente-se magoado
pela maneira como o processo está a ser conduzido, mas acredita que
o bom senso chegará e que a contestação popular obrigará os responsáveis
a reverem a projectada barragem.
«Nem quero imaginar a movimentação de terras, a abertura de canais
de derivação, colocação de postes de média tensão e diminuição do
caudal das águas do rio», referiu Fernando de Oliveira Vasconcelos.
Neste espaço marcado pela ruralidade e preservação de alguns usos
e costumes, a Câmara Municipal de Cinfães do Douro e a Associação
para a Defesa do Vale do Bestança têm um projecto comum destinado
a promover o turismo rural e pedestre, bem como à requalificação do
património local.
«A região possui grande riqueza patrimonial. Em muitas aldeias do
concelho ainda existem diversos moinhos que deviam ser protegidos
e recuperados. Por isso, não vamos permitir a construção de uma barragem
que pode destruir o sonho de várias gerações», concluiu
Jorge Ventura.
O JN tentou, sem sucesso, ouvir a posição da empresa construtora sobre
esta polémica.
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