Caminhadas mostram belezas do
Bestança
Manuel Vitorino
Participantes mergulharam num rio e
descobriam paisagens de sonho
Foram ao vale de Bestança com um
desejo comum: conhecer um dos rios menos poluído da Europa, conviver com a
Natureza e partir à descoberta do paraíso. Alguns desistiram a
meio da jornada, mas todos prometeram repetir a dose. A luta contra a
polémica construção da barragem ganhou mais adeptos. Ainda se ouvia
cantar o galo e já cerca de uma centena de aventureiros marchavam em
direcção às profundezas do vale do Bestança. Não tinham cartas
tipográficas, nem bússolas. O rio e as suas margens serviram de rota. A
viagem teve início em Poldras e, mal tinham dado o gosto ao pé, ficavam a
saber que, numa casa de pedra perdida no meio do lugar, tinha nascido o
famoso explorador africano Serpa Pinto, autor do célebre mapa côr-de-rosa,
em África. Foi a primeira surpresa do dia. Gavino Vaz Pedro, membro da
Associação para a Defesa do Vale do Bestança, deu mais pormenores do
roteiro: «A descida até ao rio demora cerca de 30 minutos. O caminho não é
muito complicado», assegurou. As dificuldades e as maravilhas da rota
vieram depois. Com a entrada no acidentado Bestança, os participantes
tiveram de percorrer, a pé, por entre rochedos e quedas de água, cerca de
sete quilómetros. O calor não foi muito sufocante, mas a caminhada até ao
lugar do Prado, em Valverde, onde estava montado o acampamento, foi dura,
difícil e longa. Ao todo, foram gastas cerca de sete horas, isto é, um
quilómetro percorrido a pé e debaixo de água demorou uma
hora.
Todos os sacrifícios
«A descida do rio valeu
todos os sacrifícios. A beleza que nos rodeia é única e, como tal, não
vamos permitir que a destruam», sinteziou Jorge Ventura, presidente da
Associação que, pela décima vez consecutiva, promove a viagem ao interior
do Bestança. «A caminhada não foi fácil, mas aquilo que se ganhou
supera todas as dificuldades. Só o prazer de tomar banho num rio sem
poluição e com uma paisagem fantástica, vale o sacrifício», aludiu o juiz
Fernando Oliveira. Nesta viagem ao desconhecido, também participou o
pequeno Artur Sousa, de 7 anos, do Porto. Veio acompanhado do pai,
comportou-se «como gente grande» e não teve medo de ultrapassar as muitas
barreiras encontradas. «Gostei muito de cá vir. Até pude tomar banho no
rio e saber mais coisas sobre o vale. Para o ano e caso o meu pai queira
voltar ao Bestança, volto a fazer-lhe companhia» afirmou. A meio da
descida, junto à ponte de traça românica de Covelas, os participantes
fizeram uma curta pausa para um ligeiro almoço e retemperar energias. A
etapa seguinte levou-os até ao acampamento, onde, depois do banho, foi
servido um cabrito assado a lenha, com arroz e batatas de
forno. anteontem, o programa foi mais ligeiro e serviu para a centena
de visitantes conhecer o património local, as pontes com história e as
belezas naturais do concelho. Uma caminhada que qualquer um pode fazer,
para conhecer um dos muitos lugares paradisíacos de
Cinfães.
Vale com vestígios da Idade Média
O rio
Bestança nasce na serra do Montemuro e desagua no rio Douro. Ao longo dos
seus cerca de 13,5 quilómetros de extensão, sobressai a verdura da
paisagem e as águas sempre cristalinas. Por isso, muitos dos moradores
daquela zona não percebem que o vale do Bestança com inegável valor
turístico/cultural e incluído na Rede Natura 2000, possa servir de cenário
à construção de duas mini-hídricas. «O Ministério do Ambiente não pode
dar luz verde a um projecto que vai destruir o património local e causar
impactos negativos na economia da região. O equilíbrio ecológico do rio
deverá merecer mais respeito pelos organismos responsáveis pela defesa do
Ambiente», lembrou Jorge Ventura. Além das belezas naturais do vale do
Bestança, o visitante que vá a Cinfães do Douro, encontra inúmeros
vestígios arqueológicos, designadamente, na Quinta da Chieira, em
Cidadelhe; uma sepultura antropomórfica de características medievais, em
Ferreiros de Tendais; a ponte de Enxidrô, na vila de Muros, em Tendais; ou
a torre senhorial de Chã, em Ferreiros de Tendais. «A defesa do vale do
Bestança, pressupõe a preservação do nosso património e legado histórico»,
concluiu Jorge Ventura.
|